quinta-feira, 16 de maio de 2013

A plenitude




"A plenitude tornou-se dolorosa e pesada e Joana era uma nuvem prestes a chover. Respirava mal como se dentro dela não houvesse lugar para o ar. Caminhou de um lado para outro, perplexa com a mudança. Como? - perguntava-se e sentia que estava sendo ingênua, aquilo tinha dois lados? Sofrer pelo mesmo motivo que a tornara terrivelmente feliz? Carregou consigo o corpo doente, um ferido incômodo, durante os dias. A leveza fora substituída por miséria e cansaço. Saciada - um animal que matara sua sede inundando seu corpo d´água. Mas ansiosa e infeliz como se apesar de tudo restassem terras ainda não molhadas, áridas e sedentas. Sofreu sobretudo de incompreensão, sozinha, atônita. Até que encostando a testa, no vidro da janela - rua quieta, a tardecaindo, o mundo lá fora - , sentiu o rosto molhado. Chorou livremente, como se esta fosse a solução. As lágrimas corriam grossas, sem que, ela contraísse um só músculo da face. Chorou tanto que não soube contar. Sentiu-se depois como se tivesse voltado às suas verdadeiras proporções, miúda, murcha, humilde. Serenamente vazia. "

(Clarice Lispector )

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